Discípula de Niéde, Marrian Rodrigues lidera novo capítulo na Serra da Capivara
Ela foi preparada e formada pela própria Niéde, que antes de partir, organizou sua continuidadeA grandiosidade da Serra da Capivara não está apenas nos cânions, nas pinturas rupestres milenares ou nas trilhas que cruzam a caatinga piauiense. Ela vive, sobretudo, nas pessoas que mantêm acesa a chama do que foi construído ao longo de décadas, com garra, ciência e resistência. E hoje, à frente dessa missão, está Marrian Rodrigues, chefe do Parque Nacional Serra da Capivara e discípula direta de Niéde Guidon, a arqueóloga que revelou ao mundo a origem do homem nas Américas.
Marrian não foi escolhida por acaso. Ela foi preparada, orientada e formada pela própria Niéde, que antes de partir, organizou a continuidade de sua obra com estratégia e responsabilidade. “Ela nunca deixaria isso aqui desamparado”, conta Marrian. “Já havia se aposentado há seis anos, mas seguia presente, sempre orientando, sempre ensinando. Eu aprendi tudo com ela.”

Sobre Marrian Rodrigues
Doutora e Mestre em Arqueologia pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro-PT, com diplomas revalidados pelo Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (MAE-USP).
Graduação em Letras/Português pela Universidade Estadual do Piauí (2003). Pesquisadora associada ao Instituto Terra e Memória (PT) e Centro de Geociências da Universidade de Coimbra. Sócia-Fundadora do Instituto Olho D Água. Chefe do Parque Nacional da Serra da Capivara/ICMBio.

em experiência na área de Arqueologia, atuando principalmente nos seguintes temas: gestão ambiental e cultural, arqueologia, educação, gestão de conflitos com comunidades tradicionais e sustentabilidade cultural.
Uma sucessão construída com afeto e propósito
Mais do que uma gestora, Marrian é filha da Serra. Nascida na região, faz parte da comunidade que aprendeu a viver em harmonia com o parque. Foi envolvida aos poucos por Niéde, que tinha como uma de suas maiores missões formar lideranças locais capacitadas para garantir a permanência de seu trabalho, mesmo após sua ausência.
“Às vezes eu chegava com um problema, buscando um conselho, e ela respondia: ‘Você tem que brigar’. No início, eu não entendia. Mas foi assim que ela construiu tudo isso. Brigando. E agora, nós também aprendemos a brigar — pelo parque, pelo patrimônio, pela história”, relembra Marrian.
O desafio de manter o extraordinário
Com a partida de Niéde há quase dois meses, o sentimento que predomina é o de luto, mas também o de responsabilidade. “Ela fez o extraordinário. Agora, o nosso desafio é manter esse extraordinário. Continuar com a excelência da gestão, com a conservação do bioma, com a pesquisa científica e com o turismo sustentável.”
Marian lidera uma equipe comprometida com esse ideal. Em parceria com a Fundação Museu do Homem Americano (FUMDHAM), o ICMBio e instituições locais, ela coordena ações de planejamento e adaptação às novas exigências do turismo e da conservação, como o plano de uso público, que visa ordenar o fluxo de visitantes e preservar as áreas mais sensíveis do parque.

Turismo com consciência: o modelo que Niéde sonhou
Marrian destaca que o turismo sustentável sempre foi um sonho de Niéde. Hoje, esse sonho começa a se concretizar. O número de visitantes tem crescido, o perfil é cada vez mais qualificado, e a comunidade local, antes alheia ao parque, hoje é protagonista.
“Vamos lançar um novo edital para cadastrar e capacitar condutores de turismo. Não basta saber o caminho das trilhas, é preciso entender o valor do que se está mostrando. Aqui é patrimônio da humanidade, é a história do mundo, e precisa ser tratada com esse cuidado.”

Um convite direto a quem ainda não veio
Marrian encerrou a entrevista com a equipe do Conecta Piauí com um convite e uma reflexão: “Os brasileiros, inclusive os piauienses, muitas vezes buscam conhecer a história dos outros em viagens ao exterior, mas esquecem que o início de tudo está aqui, na Serra da Capivara. Quem ainda não veio, precisa vir. Porque este lugar é de todos nós — e precisa ser visto, conhecido e protegido por todos.”